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É fácil perceber que a desinformação na área da saúde continua sendo um enorme desafio enquanto o mundo luta para vencer uma pandemia que já provocou milhões de mortes. Basta um rápido passeio pela internet para nos depararmos com alguma informação falsa, distorcida ou fora de contexto.
Infelizmente, este cenário não chega a ser novidade. Mas um contrapeso importante parece estar ganhando corpo no enfrentamento das “fake news”: a consciência do público de que há algo muito errado no reino da informação.
Não é fácil medir o sentimento de desconforto de quem percebe a gravidade de um ambiente poluído por tantas inverdades. Mas pouco a pouco, aqui e ali, é possível notar que mais pessoas estão cientes do que está em jogo, principalmente quando o tema envolve algo tão relevante como o novo coronavírus. Se esse alerta vai se traduzir em menos desinformação à frente, é difícil saber — mas pelo menos traz esperança de que é possível formar uma audiência mais propensa a refletir sobre a informação que consome.
Uma ampla pesquisa conduzida pelo Reuters Institute com a Universidade de Oxford em 46 países mostra que a preocupação com a desinformação cresceu este ano na comparação com 2020. Agora 58% das pessoas dizem estar preocupadas (ante 56% no ano passado). Os dados sobre o Brasil são ainda mais emblemáticos: 82% se dizem preocupados com as “fake news”.
O levantamento também aponta que políticos são o principal foco de preocupação das pessoas quando o assunto é compartilhamento de informações falsas sobre a Covid-19. Considerando todo o universo da pesquisa, essa foi a resposta de 29% dos participantes. No Brasil, 41% afirmaram se preocupar com o comportamento de políticos.
Diante de todo o mal que uma desinformação na área da saúde pode causar, é interessante que mais pessoas estejam alertas — não só ao volume de inverdades que circula pelas redes sociais, mas também a quem anda produzindo ou espalhando tais conteúdos.
Pode ser difícil identificar a origem de uma desinformação, mas está ao nosso alcance prestar atenção em quem a compartilha para cobrar que essas pessoas tenham mais responsabilidade, sejam elas do grupo de mensagens da família, amigos próximos ou políticos. Se desejamos um ambiente informacional mais saudável, é também nosso papel apontar quando um conteúdo é mentiroso, enviando uma checagem no grupo em que a desinformação circulou, chamando o amigo para uma conversa ou dando uma resposta nas urnas àqueles que não têm o mínimo cuidado com a informação.
Não podemos esquecer que a desinformação pode ser tão prejudicial quanto o vírus em si. Não é à toa que a própria Organização Mundial da Saúde (OMS) apontou, ainda em fevereiro de 2020, seu temor não apenas com a pandemia mas também com o que chamou de infodemia (uma superabundância de informações, algumas precisas e outras não, que torna difícil para as pessoas encontrarem fontes e orientações confiáveis quando precisam).
O “olhar científico” sobre a desinformação não parou aí. Pesquisadores do Centro de Políticas Públicas de Annenberg, da Universidade da Pensilvânia, da Faculdade de Medicina Weill Cornell e da ONG Critica (de Nova York) publicaram este ano um artigo em que propõem tratar as “fake news” com o mesmo procedimento adotado diante de pandemias. “Acreditamos que a propagação cruzada do vírus e da desinformação exige uma abordagem que se assemelha aos modelos epidemiológicos”, escreveram os autores, citando monitoramento em tempo real (para conter a viralização), diagnóstico preciso (para identificar o tipo de desinformação) e resposta rápida (informações baseadas em fatos e evidências).
Quem sabe um dos legados da pandemia, depois de tantas perdas, seja o entendimento de que dispor de informações de qualidade é essencial para nossa saúde — e para a saúde da nossa democracia.